quarta-feira, 28 de março de 2012

A viagem que parou e mudou o (meu) mundo - Parte 3

Um belo sorriso se destacou e de sua boca saíram as primeiras palavras daquela noite: Que bom que veio, estava com medo de que não viesse... Confesso que pensei algumas vezes em não ir, mas depois que estava no ônibus, não tinha mais volta, eu disse. Me abraçou e me convidou para entrar.

Subi as escadas, ainda nervoso, mas sem a mala, que fez questão de carregar para mim. Cheguei na sala de jantar e seus pais estavam sentados. Os cumprimentei com mais vergonha ainda e fui ao quarto, deixar minhas coisas. Conversamos um pouco, demos risadas, trocamos elogios e então nos chamaram para jantar. Estava muito nervoso... Acabei de conhecer e já estou jantando com a família? É muito nervosismo para uma pessoa só... O que terá para comer? Dizem que sou enjoado, espero que tenha algo que eu possa comer. Será que me portarei bem? Será que conseguirei ser simpático? Aliás, sou simpático? E se já causar uma impressão ruim? E se eu estragar tudo logo agora que acabei de chegar???

Sentei no lugar onde pediram e começamos a conversar. Falei um pouco da minha vida, do que faço, minha família... Mas sempre só o suficiente, para não parecer um tagarela sem noção, e sempre vermelho de vergonha quando olhavam ou dirigiam a palavra pra mim. Sentia isso. Um calor subia do peito e queimava cada milímetro do meu rosto, até chegar na minha testa, onde esse calor virava gotas de suor. Minhas mão estavam tremulas e molhadas de nervoso. Enquanto comia prestava muita atenção pra não bater os talheres no prato, senão demonstrariam o quão nervoso eu estava.

O jantar estava ótimo, sua mãe preparou um prato especialmente para mim, estava começando a me sentir mais a vontade, quando um tornado chamado “La Hermana” adentrou a sala de jantar. Eram palavras, perguntas e suspeitas voando pra lá e pra cá... Me senti no centro do tornado, vendo todas as palavras girando em torno de mim e o jantar também. Eram muitas perguntas feitas. Reza a lenda que as respondi e me saí muito bem, dizem que sou matreiro e sagaz, que tenho resposta e saída pra tudo, mas confesso que no meio daquele turbilhão de nervosismo e inquérito não lembro o que me foi perguntado e muito menos as respostas. Só sei que 7 meses depois o furacão parou de girar na minha direção e tive a confirmação de que fui bem nessas perguntas e no decorrer dos meses. Fui considerado parte da família.

Depois do jantar, uma sobremesa incrível, mas não exagerei na sobremesa. Tudo, na minha cabeça, seria motivo para ter uma imagem ruim perante a família toda. Conversamos mais um pouco e fomos para o terraço da casa. Uma vista linda, um vento ótimo. Estávamos só nós dois agora, conversando sobre tudo que conversamos durante alguns meses pela internet. Até que, inevitavelmente, e felizmente, sinto meu coração mais acelerado, seu rosto se aproximando do meu, seus olhos me olhando mais de perto, como se pudesse olhar dentro de mim através do meu olho... nossas bocas se tocam. Não me lembro exatamente o que senti, se senti, e quanto tempo ficamos alí. Só me lembro que parecíamos girar, levitar e dançar com a lua cheia como nossa única testemunha confirmando o que já sabíamos pelo mundo virtual, nosso encontro não podia ser adiado. Tínhamos que nos conhecer.

Uma foto, a primeira juntos, selou esse dia e essa viagem.

quarta-feira, 21 de março de 2012

A viagem que parou e mudou o (meu) mundo - Parte 2

Começo a ficar um pouco enjoado. Não sei o que é pior, o cheiro de álcool e suor ao meu lado ou o de mortadela que agora está impregnado no ar condicionado do ônibus. Me curvo ainda mais e coloco o nariz dentro da gola da camiseta, assim fica menos ruim. Pareço uma concha fechada em minha poltrona. Bem que poderia estar no mar mesmo, sairia nadando direto ao meu objetivo, chegaria cansado, mas chegaria rápido. Demorar e depender dos outros pra fazer as cosias não é a minha praia. Não tenho muita paciência.

Peguei meu celular e resolvi acessar o Facebook enquanto ouvia música, quem sabe assim me distraio mais e o tempo voa. Até parece... Acessar sites pelo celular é muito lento, melhor aproveitar o momento pra exercitar minha paciência, ver o que meus amigos estão fazendo e atualizar minha timeline. Já estou no ônibus, navegando rumo ao desconhecido, seguindo um farol de uma ilha ainda distante, esperando encontrar luz nessa escuridão. Foi o que postei, junto com o clipe de “Paquetá”, dos Los Hermanos, que ouvia no momento.

Mais uma parada, finalmente! Agora só faltam mais 2, uma rodoviária de uma cidade qualquer e, finalmente, a que tanto espero! Quase ninguém desce, pouca gente sobe... Mas pelo menos o senhor que estava ao meu lado desmbarcou e pude percorrer os quilômetros que faltavam mais tranquilo. A viagem continua, vou deitar nos bancos, quem sabe assim consigo tirar um cochilo.... Sonhar não custa nada, mas é lógico que não consegui. Minha cabeça estava a mil! Mais que o normal.

O resto da viagem foi tranquilo. Vi um unicórnio, ou era só um cavalo bem branco se destacando na escuridão, no meio da mata, em um terreno vazio próximo a entrada de uma cidade?! A outra parada foi a poucos minutos da anterior, agora já estou chegando... passo por uma mini ponte estaiada e vejo a cidade a minha esquerda. O ônibus retorna por debaixo da ponte e para na rodoviária. Minha vez de descer.

Minhas pernas tremem, não consigo nem digitar a mensagem direito. Cheguie, estou pegndo o taxi. Daqui uns minutios estou aí.bj. Passei o endereço para a taxista, sim, era uma mulher taxista e o carro era todo cheio de bichinhos, coisas fofinhas e tinha cheiro de flores. Em menos de 10 minutos estava na porta da casa.

Saí do táxi, respirei fundo umas 3 vezes, fui em direção à porta e toquei a campainha. Agora senti umas gotas escorrerem pelo meu rosto. Meus pés? Agitadíssimos! Que demora pra abrir a porta, será que estou no lugar errado? Será que era tudo conversa? Será que me fodi? Será que sonhei com tudo? Será que tudo foi uma criação minha? A luz acende, percebo que há uma escada. Alguém está descendo... Destranca a porta e a abre.

quarta-feira, 14 de março de 2012

A viagem que parou e mudou o (meu) mundo - Parte 1

Tudo estava estranho, senti isso desde a hora que acordei. Estava mais desastrado que o normal, fazia tudo errado e fora de ordem, conferi minha mochila, luz e gás umas 5 vezes antes de sair de casa e ir pro trabalho. O dia passou mais devagar que o normal, uma eternidade, olhava no relógio de tempos em tempos, mas esse tempo eram na verdade minutos... minuto a minuto. Não é possível uma coisa dessas... E meus joelhos mexendo. Esse dia, em especial, não paravam de se movimentar um segundo sequer. Meus dedos? sentia como se não os tivesse mais, de tanto que os cutucava com meus dentes.

Finalmente 6 horas da tarde!!! Pego minha mochila e disparo até o ponto de ônibus. Mais cheio que o normal. E o ônibus, cadê?? Verificava meu celular minuto a minuto, mas os minutos eram, na verdade, segundos, verifiquei o mesmo horário umas 3 vezes... E o pé batendo no chão... Não encontrava uma posição para me fixar. Finalmente passa o bendito, entro e consigo o último assento livre, tive sorte, pois minha mochila está mais pesada que o normal. Está lotado, as pessoas parecem estar loucas, desesperadas querendo chegar em algum lugar... Mas porque? Hoje é só mais uma sexta-feira, não é feriado nem véspera. Por que??

Desço no ponto do metrô e encaro a fila para passar a catraca. Pô, até o metrô lotado?! Hoje é dia de ser sardinha mesmo, pensei. As estações não passam, parece que ficaram mais distantes umas das outras. E que horas são? Não tenho como saber, está cheio demais, não consigo alcançar meu celular. E a perna mexendo... E os dentes, agora, mordiscando meus lábios.

Três horas depois, na verdade 40 minutos, chego na rodoviária. Muvuca! Parece até que cutucaram algum formigueiro. As pessoas parecem formigas desesperadas correndo para todos os lados, levando folha nas costas. Consigo chegar no guichê e retirar minha passagem. Estou em cima da hora, ainda bem! Desço e o ônibus já está a minha espera, e a espera de mais 43 pessoas. Me acomodo, coloco meu fone de ouvido e aperto o play. Estou dentro do ônibus, estou bem nervoso, mas daqui a pouco estou por aí, beijos. Foi a mensagem que enviei.

Muita gente estranha nesse ônibus, conversando alto, bebês chorando. O que estou fazendo aqui? Bom, é por uma boa causa, pelo menos espero que seja... Quando percebo já estou na estrada, minha cabeça está a mil, não consigo nem dizer em quantas coisas ao mesmo tempo estava pensando. Só sei que a hora não passava, e não conseguia achar uma posição boa para eu ficar. Minha perna não parava de mexer, e começava a me faltar ar. Água, preciso de água, minha boca está seca.

O ônibus estacionou. Até que enfim cheguei! Engano meu, é só a primeira parada... Rodoviária de Campinas. Os estranhos que estavam no ônibus descem, ufa! Ou azar, pois os que sobem são ainda mais estranhos. Um senhor se joga na poltrona ao meu lado, um cheiro de pinga misturado com suor, mereço isso? O que estou fazendo aqui? Tento me sentar meio de lado, com os pés na poltrona e joelhos na altura do peito, olhando a paisagem, as ávores correndo, uma a uma passando rapidamente pela janela, até que meus pensamentos são interrompidos pelo cheiro de mortadela que toma conta do ônibus... Falta muito pra chegar?

Começo esse conto hoje, em homenagem aos 10 meses.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Repeat sem Shuffle

Triiiiiiiimmmmmmm!!!! Era segunda, terça ou um outro dia qualquer da semana, acordei com o despertador do meu celular berrando na minha orelha. Ainda cansado e sonolento, o desliguei e enrolei uns 10, 15 minutos na cama, como de costume. É o tempo necessário pra assimilar que infelizmente preciso levantar. Coloquei minhas meias e fui ao banheiro mijar. Depois me olhei no espelho, lavei meu rosto e peguei a escova de dentes. Coloquei a pasta e comecei uma preguiçosa escovação, tomando cuidado com a parte de trás do lado direito inferior, que anda infeccionada devido ao maldito dente do siso. Fiz bochecho, coloquei minhas lentes, primeiro a do olho direito, depois a do olho esquerdo, coloquei minha calça que anda cada vez mais apertada (nunca imaginei que um dia falaria isso), passei desodorante, coloquei minha camiseta e depois passei perfume. Voltei ao quarto com o tédio de toda manhã, calcei meu tênis, dei um beijo no meu amor, tomei um copo d’água e saí.

Chamo o elevador e espero cantarolando alguma música, não me lembro ao certo qual, abro a porta, aperto o “T” e alguns segundo depois estou na portaria. Bom dia, digo ao porteiro, e saio da área protegida da minha casa. O dia está cinza. Respiro fundo e dou a volta no quarteirão, até o ponto de ônibus. No caminho avisto uma hiena as gargalhadas saindo de um buraco onde os animais vão para acasalar, brigas, avestruzes com pressa, cheiro de café, lixo, bebida e poluição se misturam.... E eu só queria voar....

Voar, não precisar ficar mais de uma hora aturando cheiro de suor misturado ao de marmita, esmagado dentro de um ônibus e metrô lotados a essa hora da manhã. Voar, pra ver a cidade de cima, não precisar ver paisagens que não gostaria de ver, pessoas capotadas nas ruas, seja por sono e não ter um lar, ou por terem levado tiro na cabeça. Não ter que presenciar hipocrisia e ignorância de um povo que joga lixo no córrego e depois faz protestos e falam mal da prefeitura quando o mesmo córrego alaga, pessoas que se acham corretas e perfeitas, mas na primeira oportunidade puxam o tapete das outras, as roubam ou falam por trás... Pessoas... mas não posso voar... Pessoas não voam.

Desço no ponto de ônibus e caminho alguns quarteirões até chegar à selva. Encontro meu lugar na mata e fico ali, o dia todo escutando, não concordando e fazendo piadas pra acalmar o ânimo de todos. Viver na selva não é fácil. Os animais são irracionais, agem por instinto. E o animal-pessoa é pior ainda por ser egoísta. Depois de pular de galho em galho pra resolver problemas e criar uma forma de vida melhor pros outros, desço da árvore e saio da selva, rumo à minha fortaleza segura. As piadas e descontração sarcásticas, com um “quê” de alfinetada continuam na carona até o metrô, pelo menos há risada. Dá até preguiça e desespero chegar na plataforma, a quantidade de pessoas esperando o vagão é cada vez mais impressionante. E todos desesperados querendo entrar para viajar sentado. E eu só querendo voar... Calor, suor, música ambiente de celular forçada, cheiro de salgadinho, sanduiche de mortadela, habib’s, Mc Donald’s, suor e eu aqui, encostado na porta, só esperando ela abrir para voar daqui. Geralmente desço a minha rua a pé, mas como estou com preguiça e de saco cheio, fico esperando qualquer ônibus passar, todos passam perto de casa. De volta a minha fortaleza, aperto o “5” do elevador.

Chego em casa, encontro meu amor, tomo um belo banho, sinto cada gota d’água cair e escorrer pelo meu corpo tenso. Aos poucos volto a ser eu mesmo, não um animal qualquer. Relaxo, converso, amo, dou risada, janto... Aqui não preciso voar. As horas passam rápido demais quando estamos em paz, esse é o grande problema. Acho que vou dormir, senão não consigo acordar amanhã. Escovo meus dentes, tomo um copo d’água, dou um beijo de boa noite no meu amor e capoto.

Triiiiiiiimmmmmmm!!!! Era segunda, terça ou um outro dia qualquer da semana, acordei com o despertador do meu celular berrando na minha orelha...

sexta-feira, 2 de março de 2012

Viagem prá Pirá(cicaba)


Para qualquer lado que eu olhava só enxergava amarelo. Ás vezes sentia um leve vento acalmar meu rosto. Parecia um deserto, andava e andava sem chegar a lugar nenhum, as dunas continuavam sendo as únicas coisas que eu via por todos os lados. Algo brilhou com o sol alguns metros à minha frente. utilizei minhas últimas forças e cheguei ao local, eram pequenos diamantes fincados na areia. Diamantes no deserto?? Os peguei. Em menos de 3 segundos foram escorrendo pelas minhas mãos, como se derretessem. Viraram gotas d'água, como as que escorrem pela minha testa desde que cheguei aqui.

Os reflexos do sol nas janelas dos apartamentos vizinhos me deixavam mais mole e irritado. Nunca gostei de calor, e esta cidade está insuportavelmente quente. Depois de um banho gelado decidimos sair de casa. O barulho da queda do rio nos chamava. A cada passo que dava em cima da velha ponte de madeira sentia sua força. As garças, com suas pernas fininhas, pareciam nem se incomodar ou sentir sua violência. Mais ao lado, uma outra vazão da queda d'água. As gotas parecem apostar corrida enlouquecidas. vale tudo! Essa corrida era hipnotizante, não conseguia desviar o olhar. Aos poucos ia sentindo meu corpo entrando em transe, formigando, acalmando, tonteando, girando.... girando... girando.....

Já estava ficando tonto, não sabia onde fotografar primeiro, essa usina abandonada é um ótimo cenário para fotógrafos amadores como eu. Dá para sentir história e energia pulsar de cada tijolo saltado da parede. Suas janelas são uma entrada para o passado. E o desgaste a prova de uma história que quer continuar lembrada. O sol invade cada galpão com seu ardor indiscutível, vence a barreira do vidro e ilumina as fissuras que tentam permanecer escondidas. Eu queria estar escondido naquelas fissuras, um momento de paz, isolamento, não ser lembrado e nem visto sempre, fugir do calor, das pessoas, me esconder dos holofotes do astro rei, do mundo.